Tributação de gênero: um olhar técnico e visionário 

Calculadora - taxação rosa
Calculadora - taxação rosa
Ilustração via Freepik

A tributação é um dos instrumentos mais poderosos para a redistribuição de renda e a promoção da equidade social. No entanto, a estrutura tributária de muitos países, incluindo o Brasil, tende a ser regressiva, impactando desproporcionalmente as populações mais vulneráveis, incluindo as mulheres. A desigualdade de gênero na tributação, conhecida como “gen tax” (tributação de gênero), é uma questão emergente que tem sido discutida em várias esferas acadêmicas e políticas. Este artigo aborda a tributação de gênero no contexto da reforma tributária no Brasil, com base em estudos relevantes e análises técnicas. 

Contextualização da tributação de gênero 

A tributação de gênero refere-se à maneira como as políticas fiscais afetam homens e mulheres de forma desigual, exacerbando as disparidades econômicas existentes. Estudos, como os de Elson (2006) – Budgeting for Women’s Rights: Monitoring Government Budgets for Compliance with CEDAW | Financing For Gender Equality (unwomen.org) – e Stotsky (1997) – Gender Bias in Tax Systems (imf.org), mostram que as mulheres, especialmente aquelas em grupos de baixa renda, tendem a ser mais prejudicadas por impostos indiretos, como o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), em comparação com os homens. Isso ocorre porque as mulheres geralmente gastam uma maior proporção de sua renda em bens e serviços essenciais, que são mais suscetíveis a tributações elevadas. 

Além disso, a falta de consideração das diferentes realidades de gênero nas políticas tributárias perpetua a desigualdade econômica, como evidenciado por Grown e Valodia (2010) – Taxation and Gender Equity: A Comparative Analysis of Direct and Indirect Taxes in Developing and Developed Countries | IDRC – International Development Research Centre (idrc-crdi.ca). Argumentam que as políticas fiscais não neutras podem reforçar as disparidades de gênero no mercado de trabalho e na distribuição de riqueza. 

A reforma tributária no Brasil e o impacto de gênero 

O Brasil está atualmente em um processo de mudança que visa simplificar o sistema tributário, aumentar a eficiência na arrecadação e promover a justiça fiscal. Entretanto, um aspecto crítico que precisa ser considerado nessa reforma é o impacto das mudanças fiscais sobre as mulheres e outros grupos vulneráveis. 

Artigos corroborados em diversos estudos nacionais e internacionais, como o de Lais Abramo (2022) – Teoria e Debate | Desigualdades no mundo do trabalho: estruturais, múltiplas e entrecruzadas – Teoria e Debate, destacam que as políticas de economia públicas no Brasil historicamente negligenciaram as implicações de gênero, contribuindo para a perpetuação das desigualdades. A proposta de unificação de impostos, por exemplo, pode ter um impacto desproporcional sobre as mulheres se não forem consideradas as diferentes formas como homens e mulheres consomem bens e serviços. 

Propostas para uma reforma tributária com perspectiva de gênero 

Para garantir que a Reforma Tributária promova a equidade de gênero, é essencial incorporar uma análise de gênero em todas as fases de formulação e implementação das políticas fiscais. Aproveito este artigo para propor algumas propostas, que incluem mas não se limitam em si: 

  • Análise de Impacto de Gênero: Realizar avaliações de impacto de gênero para cada nova política fiscal, como sugerido por organizações como o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Essas análises ajudariam a identificar possíveis efeitos adversos sobre as mulheres e a ajustar as políticas de forma a mitigá-los. 
  • Isenção de Impostos para Bens Essenciais: Propor isenções ou reduções de impostos sobre produtos de higiene menstrual, como absorventes e fraldas, que são itens de consumo essencial para as mulheres. A tese é defendida em estudos de mulheres economistas como Sonia Rocha e Lena Lavinas. 
  • Incentivos fiscais para mulheres empreendedoras: Implementar incentivos fiscais para empresas lideradas por mulheres, como sugerido por estudos do Banco Mundial (2022), para incentivar o empreendedorismo feminino e reduzir as barreiras econômicas enfrentadas por mulheres no mercado de trabalho. 
Estudos de caso internacionais 

Experiências internacionais podem fornecer insights valiosos para a reforma no Brasil. Países como Suécia e Islândia têm implementado políticas fiscais que consideram as diferenças de gênero, resultando em sistemas tributários mais equitativos e inclusivos. Esses exemplos destacam a importância de uma abordagem fiscal que considere as necessidades específicas das mulheres e promova a equidade de gênero. 

Conclusão 

A reforma tributária no Brasil apresenta uma oportunidade única para corrigir as desigualdades de gênero perpetuadas pelo sistema tributário atual. Incorporar uma perspectiva de gênero nas políticas fiscais não é apenas uma questão de justiça social, mas também uma estratégia para promover o desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo. 

Este artigo destaca a importância de uma abordagem proativa na consideração dos impactos de gênero na reforma tributária, utilizando estudos robustos para fundamentar a necessidade de políticas fiscais mais equitativas. A implementação dessas medidas pode transformar a estrutura tributária brasileira em um mecanismo de promoção da igualdade de gênero, contribuindo para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva. 


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