Reforma Tributária (enfim) regulamentada: como arregaçar as mangas

Reprodução: Freepik

Por Matheus Bueno

Direto ao ponto: O ano de 2024 é encerrado com a aprovação pelo Congresso Nacional da primeira Lei Complementar regulamentadora da Reforma Tributária. Se há doze meses a Emenda Constitucional 132 firmou em poucos artigos os alicerces de uma nova tributação do consumo sob a promessa de neutralidade e simplicidade, a sua primeira norma regulamentadora já acrescenta centenas de regras e inúmeras ponderações para os contribuintes que já se sabe terão de conviver com o regime atual e o novo por diversos anos. Não é improvável haver o negado aumento de carga. Quanto à simplificação, ainda que futuramente melhorada, até o fim da transição o cenário é decepcionante, para dizer o mínimo. Em 2025, além de tocar a já difícil vida em suas áreas fiscais, como sempre, contribuintes terão de aguardar diferentes novas levas de normas ainda mais detalhistas, agregando mais camadas de complexidade no dia a dia enquanto se preparam para o novo regime. Preparar-se para 2026, início da transição, é um projeto de alta complexidade e média a longa duração, de modo que os gestores fiscais – acostumados a conceitos jurídicos, contábeis e financeiros – podem muito ganhar ao beberem na fonte de estratégias organizacionais e de gerenciamento de projetos.

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Afetando a reforma tributário do consumo todas as compras e vendas de um negócio, é improvável imaginar um contribuinte que não tenha pelo menos diversas de suas divisões internas impactadas. Essa novidade legislativa ampla vai demandar um nivelamento mínimo de conhecimento entre profissionais de diferentes formações, além de atingir naturalmente fornecedores e clientes.

A nosso ver, a identificação e compreensão dos impactos dos novos regimes fiscais deve extrapolar as tradicionais áreas financeira e legal e convidar diferentes responsáveis do negócio a contribuir para a preparação da empresa. É uma causa suficiente para a criação de um comitê interdisciplinar, em outras palavras.

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Mas gerenciar um projeto de grande complexidade que envolve diversas equipes e deve ser concluído em um prazo de meses exige habilidades organizacionais, técnicas e de liderança. A complexidade vem não só da grande quantidade de tarefas a serem realizadas, mas também da necessidade de coordenação entre diferentes equipes com competências distintas. 

Em um cenário como esse, a utilização de ferramentas de gestão adequadas, como a matriz RACI, é essencial para dar ritmo e previsibilidade ao andamento do projeto.

A matriz RACI é uma ferramenta de gerenciamento de responsabilidades amplamente utilizada em projetos que envolvem múltiplas equipes e funções. O termo RACI é um acrônimo que significa Responsável, Aprovador, Consultado e Informado. Cada uma dessas categorias tem um papel bem definido no processo de gestão:

Responsável (R): Refere-se à pessoa ou equipe diretamente responsável por executar a tarefa. Essa pessoa é quem fará o trabalho, assegurando que as ações sejam realizadas corretamente.

Aprovador (A): Esta é a pessoa que tem a autoridade final sobre o trabalho realizado. Ela é responsável por revisar e aprovar as entregas, garantindo que atendam aos requisitos definidos.

Consultado (C): São as partes que, embora não executem diretamente a tarefa, fornecem informações valiosas e consultoria. Eles são envolvidos em discussões e ajudam na tomada de decisões.

Informado (I): São os stakeholders que devem ser mantidos atualizados sobre o progresso do projeto, mas não participam diretamente das tarefas ou decisões.

A implementação da matriz RACI permite uma visualização clara das responsabilidades de cada pessoa ou equipe em relação às diferentes tarefas do projeto. Isso facilita a comunicação, evita sobrecarga de funções e assegura que nada seja negligenciado, pois todos sabem quem deve fazer o quê, quem aprova, quem precisa ser consultado e quem deve ser informado. A clareza proporcionada pela matriz ajuda a criar um ritmo constante no trabalho e aumenta a previsibilidade das entregas, essencial quando se tem um prazo longo e muitas etapas a cumprir.

No tema da reforma tributária, as possíveis avaliações sujeitas a tal matriz pode ser assim visualizada, como mera amostra:

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Além disso, em projetos complexos, onde diferentes áreas do conhecimento estão envolvidas, a gestão do projeto deve caminhar em paralelo com as competências técnicas de cada área. Cada equipe tem uma expertise específica, e a gestão do projeto precisa ser adaptada a essas competências. Por exemplo, enquanto uma equipe de desenvolvimento de software pode estar focada em criar soluções tecnológicas, uma equipe de marketing pode estar trabalhando na comunicação da entrega do produto. A interdependência entre essas áreas exige uma gestão que compreenda profundamente o papel de cada uma, com entregas alinhadas ao que é esperado e ao que é possível dentro de cada especialidade.

Aqui, a gestão de projetos não se resume a apenas um controle do cronograma e orçamento. Ela envolve uma visão estratégica de como as habilidades técnicas de cada equipe se entrelaçam para cumprir os objetivos do projeto. É preciso garantir que os líderes de cada equipe tenham autonomia suficiente para tomar decisões técnicas, mas ao mesmo tempo, ser supervisionados e integrados de forma eficaz, através de reuniões periódicas de acompanhamento, revisões de progresso e ajustes nos planos de ação.

Por isso, as reuniões periódicas desempenham um papel crucial, pois são momentos de alinhar as entregas, discutir obstáculos e tomar decisões cruciais. Elas devem ser bem estruturadas, com uma agenda definida e foco nas questões mais críticas do momento. A matriz RACI ajuda a manter essas reuniões produtivas, ao garantir que todos os envolvidos saibam claramente qual é a sua função no projeto, evitando discussões desnecessárias sobre responsabilidades.

Em resumo, gerenciar um projeto de grande complexidade como a reforma tributária brasileira em um prazo de meses exige não só uma gestão eficiente do tempo e recursos, mas também um entendimento profundo das competências técnicas de cada área envolvida. A matriz RACI é uma ferramenta fundamental para dar clareza, ritmo e previsibilidade ao projeto, garantindo que as equipes trabalhem de maneira alinhada e eficiente, com foco no cumprimento dos objetivos dentro do prazo estipulado.

E como conciliar isso com a já saturada capacidade de entrega dos times internos? Como já bem alertado por Fernanda Lains e Laura Favaretto, “agora, mais do que nunca, o investimento em assessores externos é imprescindível para dimensionar corretamente o que fazer e quando fazer. Líderes preparados para tomar as decisões corretas e antecipar os futuros cenários de ação são essenciais diante dessa reforma tributária do consumo que deve ser aprovada ainda neste mês. Essas ações podem significar maximizar ganhos e minimizar perdas para qualquer negócio, o que será diferencial para manutenção da saúde financeira das empresas.”

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Matheus Bueno é Advogado (USP, 2001), especialista em tributário (IBET, 2003; IBDT, 2008; Georgetown Law, 2012). Sócio do Bueno Tax, boutique com clientes de diversas verticais da economia.


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