População teme maior cobrança de impostos por Lula e Receita falha na comunicação

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (e) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (e) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (e) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (d), durante reunião ministerial, no Palácio do Planalto – Foto: Marcelo Camargo via Agência Brasil

Por Douglas Rodrigues

O ano virou e a Receita Federal mudou algumas regras, como de praxe. O Fisco aumentou a mira para fiscalizar empresas e pessoas que cometem fraudes.

Uma instrução normativa, de setembro –que entrou em vigor agora–, aumenta o número de instituições financeiras que devem repassar dados sobre os contribuintes. A Receita já tem muitos dados. Agora, terá mais.

Quem tem carteira assinada ou declara seus rendimentos como PJ não tem muito o que se preocupar. Empresas com contabilidade já sabem do seu serviço. O Fisco está de olho mesmo em quem tem renda de R$ 15 milhões por ano, o verdadeiro grande contribuinte. É esse grupo que os auditores passam a lupa ao longo do ano.

Mas o caso acendeu um alerta e viralizou nas redes: o temor de cair na malha fina (se você sonega) ou o medo de que o governo Lula pode “criar’ um tributo sobre transações financeiras. Nessa história, rolou a ideia de que uma taxa sobre o Pix pode ser criada –o que não existe.

Isso é acentuado porque cada vez mais pequenos prestadores de serviço ganham dinheiro com o Pix. O Brasil tem mais de 15 milhões de MEIs (microempreendedores individuais) formalizados. Fora os outros informais. Ou seja, muito da renda da população vem de serviços que não são “legalizados”, seja por estarem no começo ou por dificuldade de se formalizarem.

O caso entrou para a política. Muitas pessoas discordam de o Fisco ter tantas informações. É legítimo. Outras foram defender o governo. Faz parte.

Um vídeo do senador Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG) viralizou na rede social X (ex-Twitter) após criticar o governo por buscar mais informações da sociedade. Na publicação, o senador descreveu Lula como hipócrita e citou notícia sobre o sigilo de 100 anos sobre os gastos do cartão corporativo da presidência. A postagem de Cleitinho teve mais de 219 mil visualizações. Há base para todos os argumentos.

Aos fatos:

  • Até o ano passado, o Fisco já recebia esse tipo de informação dos bancos tradicionais, públicos e privados, em operações como Pix aplicações financeiras, seguros, planos de previdência e investimentos em ações.
  • A principal mudança foi a extensão do monitoramento de transações financeiras às transferências Pix que somam pelo menos R$ 5 mil por mês para pessoas físicas e R$ 15 mil para pessoas jurídicas.
  • Antes, a comunicação era feita a partir do limite mensal de R$ 2 mil para as movimentações de pessoas físicas e de R$ 6 mil no caso de pessoas jurídicas. Significa que você que já tinha conta no Banco do Brasil e com essa movimentação, por exemplo, já era fiscalizado.
  • Os dados consolidados poderão ser usados na declaração pré-preenchida do Imposto de Renda no futuro. Isso pode facilitar a vida de muita gente que já usa a declaração pré-preenchida.
  • As movimentações realizadas antes de janeiro de 2025 NÃO serão incluídas nas novas regras.

Leia a íntegra da decisão da Instrução Normativa.

Golpe baixo

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fez um vídeo para desmentir uma deepfake criado com o rosto dele. Disse ele: “Imposto sobre o Pix, mentira. Imposto sobre quem quer comprar dólar, mentira. Imposto sobre quem tem animal de estimação, mentira”. O caso foi parar na AGU.

A Receita registrou algumas fraudes financeiras com tudo isso.

Em um dos golpes que rendeu toda essa história, uma conta utiliza o logotipo da Receita Federal no WhatsApp e diz ao receptor: “Bom dia sr. Neuso, você foi taxado por usar mais de 5 mil reais no PIX neste mês. Para evitar o bloqueio total do seu CPF, pague o boleto a seguir no valor de R$ 845,20”.

Hoje em dia um golpista pode mandar essa mensagem para milhares de pessoas. Se um percentual pequeno cair na armadilha, o lucro é relevante. Aí o risco da desinformação.

  • Lula fez um vídeo doando um pix de R$ 1.013 ao Corinthians para negar qualquer novo tributo. O vídeo deu uma ótima audiência para o público dele (e rendeu debate). Só que nem todo mundo teme o tributo sobre o Pix, mas o Imposto de Renda, que está envolvido de fato. O governo poderia explicar melhor do que tudo se trata.

Conclusão: há uma desconfiança da população de que o governo quer cada vez mais taxar elas (há muitos dados que corroboram isso). Por outro lado, há um debate cada vez maior até onde isso é justo. Há desinformação, piada e muito humor crítico com o caso (vide memes). A Fazenda também tem dificuldades de comunicar as mudanças. São muitos lados de uma mesma moeda.


Douglas Rodrigues é editor-chefe no Portal da Reforma Tributária