
A elevada complexidade do sistema tributário vigente, marcada pela multiplicidade de obrigações fiscais, especialmente acessórias, impostas por diferentes entes federativos, fez da concessão de regimes especiais um instrumento estratégico para simplificar a gestão empresarial e viabilizar o cumprimento das exigências fiscais de forma mais eficiente.
Desde a definição de formas diferenciadas de recolhimento de tributos até a simplificação das obrigações acessórias, esses regimes desempenham um papel fundamental na redução da burocracia e na eficiência do sistema tributário, inclusive do ponto de vista do fisco que, com a adoção de regimes especiais, tem a capacidade de fiscalizar melhor as operações dos contribuintes.
Para empresas de tecnologia, por exemplo, a alta frequência de transações e o grande volume de usuários tornam a emissão individualizada de notas fiscais uma tarefa hercúlea. O registro separado de cada operação aumenta a complexidade administrativa e os custos operacionais das empresas. Em setores com cobranças periódicas, micropagamentos ou serviços digitais em larga escala, essa exigência pode comprometer a eficiência e a escalabilidade do negócio. Assim, regimes especiais e mecanismos de simplificação fiscal são essenciais para reduzir a burocracia sem afetar a conformidade tributária.
Essa prática de concessão de regimes especiais se tornou tão comum no sistema tributário atual que, por vezes, a própria administração tributária edita normas que concedem tais regimes a determinados setores ou atividades. Isso se verifica, por exemplo, no Município de São Paulo, que editou uma instrução normativa para permitir a emissão de nota fiscal única mensal para serviços de disponibilização de conteúdo e de inserção de material publicitário, justamente por se tratar de atividades que envolvem um grande volume de operações das empresas.
No entanto, com a implementação integral da reforma tributária, será fundamental avaliar os impactos sobre os regimes especiais vigentes, especialmente durante o período de transição, em que os contribuintes precisarão conciliar simultaneamente as obrigações fiscais do sistema atual com as exigências do novo modelo.
A simplificação do sistema tributário, incluindo a modernização das obrigações acessórias, tem sido um dos pilares centrais da reforma tributária. Nesse contexto, destaca-se a implementação da Nota Fiscal de Serviço Eletrônica (NFS-e) em âmbito nacional, uma iniciativa que reúne entidades como a Confederação Nacional de Municípios (CNM), prestadores de serviços e representantes da Receita Federal do Brasil. Como parte desse processo, a Secretaria-Executiva do Comitê Gestor da NFS-e já divulgou uma nota técnica com ajustes no layout desse documento, incorporando as novas diretrizes da reforma tributária e promovendo maior padronização e eficiência no cumprimento das obrigações fiscais.
No entanto, até o momento, não há definições claras sobre como serão tratadas as obrigações fiscais dos contribuintes que atualmente se beneficiam de regimes especiais, sejam aqueles estabelecidos por normas administrativas aplicáveis a setores inteiros ou aqueles concedidos individualmente a empresas específicas, com ou sem prazo de duração.
Para as empresas que atualmente operam sob regimes especiais, é fundamental que a fase de transição e implementação da reforma tributária receba uma atenção especial. A adaptação a um novo modelo tributário exigirá ajustes nos processos internos, sistemas de gestão e estratégias fiscais para garantir a conformidade com as novas regras. Além disso, a falta de diretrizes claras sobre o tratamento desses regimes durante a transição pode gerar incertezas e dificuldades operacionais, tornando essencial um planejamento detalhado e a definição de medidas específicas para mitigar impactos e assegurar a continuidade das atividades empresariais sem comprometer a eficiência tributária.
Especialmente durante a fase de transição, as empresas precisarão conciliar a manutenção dos regimes especiais vigentes com a adaptação às novas regras tributárias. Isso significa que, simultaneamente, terão que cumprir as exigências do sistema atual enquanto se estruturam para a implementação das novas normas. Assim, será essencial que as empresas se preparem com antecedência, investindo em tecnologia e consultoria especializada para minimizar impactos e garantir uma migração eficiente para o novo modelo tributário.
Diante desse cenário, apesar dos avanços na regulamentação da reforma tributária e das discussões sobre a implementação de novos sistemas, ainda é essencial garantir atenção especial a situações específicas de apuração, recolhimento e cumprimento de obrigações acessórias. A falta de previsibilidade sobre o tratamento dessas particularidades pode gerar impactos negativos para os contribuintes, contrariando os próprios objetivos da reforma, que busca simplificação e maior segurança jurídica. Portanto, para que a transição seja eficaz e justa, é imprescindível que a regulamentação contemple soluções adequadas para esses casos, assegurando que a modernização do sistema tributário não resulte em entraves operacionais ou ônus desproporcionais às empresas.
Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.
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