Os modelos de negócios das empresas devem ser impactados pela reforma tributária?

Há um hábito empresarial brasileiro de tentar identificar cada atividade específica contida em um contrato para refletir exatamente escopo da contratação e o preço proporcional correspondente, para atender o tratamento tributário adequado, escreve Luiz Roberto Peroba
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Foto: Marcos Santos via USP Imagens

O desenvolvimento dos negócios nas últimas duas décadas, impulsionado pelo avanço das novas tecnologias, produziu modelos de negócios em que empresas passaram a fornecer, por meio de pagamento de preço único (em alguns casos periódicos, denominados assinaturas), vários produtos e serviços de distintas naturezas.

Esses contratos definidos como complexos pelo código civil brasileiro funcionam muito bem em outras jurisdições, mas geram uma série de controvérsias e disputas no âmbito tributário brasileiro.

Devido à divisão de competência tributária instituída pela Constituição Federal de 1988, principalmente entre Estados e Municípios, as bases de incidência tributária ficaram fragmentadas, resultando em tributação distinta, com diferentes mecânicas de incidência, alíquotas, benefícios, prazos para pagamento e cumprimento de obrigações acessórias.

Diante disso, passou a ser um hábito empresarial brasileiro tentar identificar cada atividade específica contida em um contrato para refletir exatamente escopo da contratação e o preço proporcional correspondente, para atender o tratamento tributário adequado, conforme se trate de uma venda de mercadoria, prestação de serviço específico, uma locação de um bem, prestação de serviço de comunicação ou energia, entre outros. Isso gera burocracia desnecessária, riscos empresariais indesejados, atrapalha padronização e tira ou atrasa a implementação no Brasil de produtos globais.

Essa adaptação dos negócios ao modelo tributário brasileiro, impulsou a formatação de vários planos de negócio a partir dessas premissas. Essa lógica tem por objetivo a definição certeira de um preço de venda. Para o empresário, que tem por objetivo vender o seu produto pelo melhor preço possível e margem razoável, a pior surpresa é identificar em algum momento futuro após a venda, que o seu preço estava equivocado. Isso porque tributação de consumo aplicável a períodos passados (cobrados por meio de autos de infração com penalidades e juros) não pode ser mais repassada ao cliente. Ela se torna uma contingência e deve ser arcada pelas próprias empresas e por isso reduzem automaticamente seus respectivos lucros e resultados.

Sabemos que a mesma lógica tem se aplicado há algum tempo no Brasil para aquelas situações de benefícios fiscais estaduais que faz com que empresas deixem de lado o melhor e mais eficiente plano logístico (como ocorre em qualquer outra jurisdição), para buscar estruturas que tragam benefícios tributários expressivos que permitam a definição de um melhor preço final para fazer frente à competição de mercado. Também não é diferente com benefícios municipais, onde vemos empresas de serviços que acabam por se estabelecer em munícipios que não tem relação direta com suas atividades ou com seu mercado, mas propiciam a venda do seu produto com menor carga.

Com a reforma tributária em pauta e previsão de implementação do IBS e da CBS a partir de 2016, espera-se uma simplificação e unificação da tributação sobre o consumo para substituir esse atual modelo fragmentado. Esses novos tributos adotarão uma base ampla, tributação no consumo, aplicando-se de forma uniforme em todo o território nacional sobre uma vasta gama de atividades econômicas com a mesma alíquota, inclusive aquelas que atualmente podem não ser tributadas por situações de não incidência ou benefícios fiscais.

No longo prazo, essa reforma tributária representa uma oportunidade para o Brasil modernizar seu sistema fiscal, alinhando-se a modelos de tributação bem-sucedidos amplamente adotados há décadas em países desenvolvidos. Com a transição para o novo sistema, os executivos brasileiros deverão se preparar para essas mudanças, reavaliar as premissas dos planos de negócios até então desenvolvidos e contratos em vigor, buscando entender os impactos do novo sistema tributário para a suas respectivas empresas, clientes e fornecedores, garantindo redefinição adequada de seus preços, aliada a simplificação e conformidade tributária.


Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no escritório Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.


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