Os Impactos da Reforma Tributária no setor de serviços 

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Por Victoria Sanchez

Enquanto a Reforma Tributária caminha a passos largos e promete uma transformação significativa na sistemática da cobrança de impostos no país, seus efeitos são variados, podendo implicar mudanças operacionais, de custos e estratégicas, mais ou menos profundas, de acordo com o setor econômico das empresas.   

Para o segmento de serviços, por exemplo, a reforma traz consigo toda uma cadeia de alterações fiscais que envolvem desde o modelo de apuração até o cálculo dos tributos. Além disso, o mercado discute um potencial e expressivo aumento da carga tributária para o setor – ​​segundo pronunciamento inicial da Confederação Nacional do Comércio, Serviço e Turismo (CNC), essa alta pode superar os 80%. Posteriormente, a entidade reconheceu avanços após emendas acolhidas pelo relator do projeto no Senado, destacando passos importantes na redução de custos e promoção da competitividade, mas alertando para a necessidade de novos ajustes para mitigar riscos as empresas. 

Diante desse contexto, uma série de desafios se colocam para as empresas do setor, que precisarão se adaptar às novas exigências fiscais e revisar profundamente suas estratégias financeiras, contratuais e de precificação, de modo que possam manter um crescimento sustentável ​ao longo dos próximos anos e dentro do processo de implementação da reforma. 

Essa adaptação, aliás, é urgente, uma vez que, já em 2026, o país caminha para o período teste de implementação das primeiras alíquotas do CBS e do IBS.  

Daí a necessidade de um planejamento robusto este ano, a começar pela compreensão detalhada das mudanças e de um estudo sobre os impactos que as novas regulamentações podem gerar, por exemplo, no fluxo de caixa das empresas, garantindo que a transição para o novo sistema tributário não comprometa a liquidez das empresas.  

O desafio da não-cumulatividade 

Um dos principais e mais impactantes aspectos da Reforma é a introdução do princípio da não-cumulatividade para o setor de serviços, uma prática já comum na cadeia de produtos.  

Antes, os serviços não eram sujeitos a esse princípio, o que agora exigirá das empresas adaptações significativas. A não-cumulatividade permitirá que impostos pagos em etapas anteriores sejam compensados, porém, também aumentará a complexidade dos cálculos tributários, exigindo ainda uma compreensão de como essa dinâmica influencia no controle dos custos e no controle dos fluxos de entrada e saída de recursos.  

A falta de preparação ao longo deste ano pode levar a problemas no caixa e à perda de competitividade, ao passo que o potencial aumento da carga tributária exige um planejamento detalhado tendo-se em vista, inclusive, uma eventual revisão nos preços finais dos serviços oferecidos aos consumidores.  

​​​Efeitos nos regimes tributários 

Ato contínuo, é importante considerarmos que a reforma traz consigo mudanças significativas para prestadores de serviços enquadrados em diferentes regimes fiscais.  

No caso das empresas ou profissionais autônomos que operam pelo Simples Nacional, por exemplo, há duas modalidades a serem consideradas: o Simples Padrão, em que os tributos já são pagos de forma unificada dentro do regime, e o Simples Híbrido, no qual o prestador opta se prefere pagar os impostos sobre consumo IBS e CBS fora da sistemática do DAS (guia unificado do Simples).  

Nesse cenário híbrido, a empresa adere ao modelo de geração de créditos tributários como um caminho para a competitividade, haja vista que, com a introdução do CBS e do IBS, os benefícios do Simples Nacional podem ser reduzidos, tornando o regime menos atrativo para algumas empresas. 

Mas essa decisão deve ser tomada considerando-se, dentre outros pontos, o impacto direto no caixa (uma vez que, no modelo do Simples Híbrido, há um aumento de carga), os desafios para a compensação dos créditos e se a opção compensa no longo prazo em termos de sustentabilidade financeira e competitividade. 

Já para empresas que estão no Lucro Real e Lucro Presumido, as mudanças são ainda mais estruturais. A possibilidade de tomada de crédito sobre insumos e despesas, por exemplo, passa a ser um fator determinante na estrutura de custos e na precificação dos serviços.  

E, ainda que haja a possibilidade de redução de carga fiscal mediante o aproveitamento de créditos (como ocorrerá no Simples Híbrido), o novo modelo pode representar um aumento geral dos custos tributários – sobretudo com o anúncio recente do IVA na casa de 28%, conforme estimativa do próprio Governo Federal. 

Diante deste panorama, o planejamento tributário se torna ainda mais indispensável para todas as empresas do setor de serviços. A necessidade de avaliar os impactos da reforma sobre cada regime fiscal exige um olhar estratégico para evitar perdas financeiras e manter a competitividade. Empresas precisarão revisar sua estrutura de operações, considerar a readequação do regime tributário e adotar ferramentas de automação para garantir conformidade e eficiência na nova realidade fiscal. 

Impactos jurídicos e tecnológicos 

Por tudo isso, a implementação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) traz, além do impacto financeiro, desafios no âmbito jurídico e contratual.  

A partir da vigência da nova legislação, as empresas precisarão, ao que tudo indica, renegociar contratos e ajustar cláusulas que considerem os novos custos fiscais. Contratos de longo prazo, especialmente, deverão ser revisitados para incluir mecanismos de reajuste ou compensação tributária, de modo a evitar disputas legais e assegurar a sustentabilidade dos negócios. 

E tudo isso considerando ainda que a reforma altera o critério de apuração dos impostos de serviço, baseando-se agora no destino onde o serviço é utilizado, em vez do local de origem da prestadora. Essa mudança impõe a necessidade de uma revisão nas estratégias na operação fiscal das empresas, que precisarão lidar com diferentes alíquotas conforme o local de consumo dos serviços.  

A adaptação a esse novo modelo, por sua vez, requer também uma abertura definitiva para um movimento de digitalização dos departamentos tributários, visando, sobretudo, a automação dos processos fiscais e a emissão das notas fiscais de serviço. 

Atualmente, é importante lembrar que cada município possui um layout próprio para a emissão de NFS-es, o que torna tal rotina complexa e fragmentada. A proposta da reforma inclui a unificação desses layouts, mas a curva de adesão espontânea de todos os municípios do território nacional a um modelo único é longa e desafiadora.  

Nesse sentido, para as empresas, a automação e a digitalização de processos fiscais são etapas que se colocam como determinantes para garantir não só eficiência, mas também conformidade e capacidade de se lidar tanto com múltiplos modelos de layout (conforme o contexto atual) quanto para que elas se preparem para a jornada de unificação proposta pela reforma. 

Do presente para o futuro 

Diante desses desafios, as empresas de serviços têm em 2025 um período determinante para que possam se preparar de forma proativa para os impactos da Reforma Tributária no setor. A adoção de soluções tecnológicas avançadas será fundamental para facilitar nesse processo de transição, maximizando a eficiência e reduzindo ainda os custos com penalidades e erros operacionais. 

Em outras palavras: embora traga desafios inegáveis e novos paradigmas fiscais, a reforma é também uma oportunidade para que as empresas de serviço modernizem seus processos, tendo, na inovação, uma base sólida para o crescimento. 


Victoria Sanchez é Chief Product Officer da NFE.io, profissional experiente em gestão de produtos, com 20 anos de atuação em grandes companhias. Especialista em transformar desafios complexos em soluções estratégicas, possui forte liderança, conhecimento profundo de negócios e tecnologia, além de habilidade em metodologias ágeis. Sua gestão ambidestra permite evoluir produtos existentes e desenvolver novas soluções de alto impacto, garantindo eficiência operacional e maior produtividade para as organizações.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.