O que é o split payment

Entenda a tecnologia que promete modernizar a cobrança de impostos

Por Regina Krauss

Uma das principais apostas do modelo de reforma tributária sobre o consumo que está sendo implementada atualmente no Brasil é o split payment. Através dele, a CBS e o IBS – que compõem o IVA dual, coração da reforma – passarão a ser recolhidos no momento do pagamento ao fornecedor. 

A tecnologia promete combater a sonegação e a inadimplência, além de modernizar o sistema tributário. O split payment está previsto no artigo 27 do PLP 68/2024, que descreve as modalidades de pagamento dos tributos e também nos artigos 50 e 51 do projeto.

De acordo com a proposta do governo, o IBS e a CBS sobre operações com bens ou serviços poderão ser pagos através de:

  1. Compensação com créditos: o contribuinte utiliza créditos de IBS e CBS para abater o valor devido.
  2. Pagamento direto: realizado pelo contribuinte sem compensação.
  3. Recolhimento na liquidação financeira da operação: conhecido como split payment, onde os valores devidos são automaticamente retidos no momento do pagamento da fatura ou boleto pelo banco, conforme os artigos 50 e 51.
  4. Recolhimento pelo adquirente: o adquirente recolhe diretamente, conforme o artigo 52.
  5. Recolhimento por responsável: quando a lei atribui a responsabilidade a outro sujeito.

O desenho do split payment está em andamento sob a condução do Ministério da Fazenda e com a participação, entre outros atores, do Banco Central e dos fiscos federal, estaduais e municipais. O desenvolvimento terá três etapas: vinculação do débito a cada operação com nota fiscal; vinculação da nota fiscal à transação de pagamento; adição de tecnologia inteligente para acesso ao sistema e verificação do respectivo crédito utilizado para pagamento parcial do tributo e segregação na liquidação financeira da transação somente da diferença em aberto.

A Câmara e o Senado estudam a definição de três modalidades de split payment: automático, manual e simplificado, este último voltado para o varejo. 

No split payment inteligente, será recolhido apenas a diferença do valor que incidir na operação e o imposto já pago por meio de compensação de créditos do fornecedor. O modelo deve consultar o sistema da Receita Federal e Comitê Gestor do IBS) para fazer o recolhimento.

O split payment simplificado, que é opcional e reservado às operações de varejo, prevê uma alíquota fixa de IBS e CBS ao setor. Essa alíquota será calculada a partir de uma média de venda dos produtos do contribuinte. No caso do varejo, pela variedade de bens comercializados, há a compra tanto de produtos com alíquota cheia quanto de mercadorias com alíquota reduzida ou produtos isentos, como no caso da cesta básica, por exemplo. No final do mês, a empresa recebe créditos caso tenha pagado mais do que o devido. Caso contrário, paga o que faltou.

Já o split payment manual é reservado para os pagamentos fora do sistema financeiro, como compras em dinheiro ou cheque. Nessas situações o pagamento é feito manualmente às administrações, com devolução de créditos em até três dias.

As empresas prestadoras de serviços de pagamentos serão responsáveis por segregar e recolher os valores do IBS e da CBS, não sendo responsáveis em caso de inadimplência ou erro nas informações apresentadas. Essa era uma preocupação do setor financeiro.

Hiato de conformidade

No sistema atual, o princípio da não-cumulatividade plena não é uma realidade. Dentre os motivos, as dificuldades em aproveitar os créditos em decorrência dos tributos incidentes na etapa anterior. Além disso, à sistemática de cálculo dos tributos “por dentro”, que faz com que o tributo faça parte da sua própria base de cálculo (tributo sobre tributo) e que a alíquota efetiva seja maior do que aquela prevista na legislação. Tudo isso, onera o contribuinte e não traz a devida transparência quanto ao montante dos tributos pagos na compra de mercadorias e serviços. 

O principal benefício do split payment para a arrecadação pública é a redução das possibilidades de fraude, sonegação e inadimplência, que atualmente compõem uma parte significativa do chamado “hiato de conformidade” no Brasil. O Ministério da Fazenda estima que a adoção deste modelo resulte em uma queda de até três pontos percentuais na alíquota de referência da CBS e do IBS.

Bernard Appy, secretário extraordinário da Reforma Tributária, defende que com este modelo o Brasil “terá um dos sistemas de documentos fiscais eletrônicos e um dos sistemas de pagamento mais avançados do mundo”.

Para os bancos, a introdução do split payment representa uma nova fonte de receita, uma vez que desempenharão um papel central no cálculo e na retenção dos tributos. No entanto, também implica novos desafios operacionais e a necessidade de ajustes tecnológicos. Hoje, o modelo de split já é utilizado em transações feitas via marketplace ou em plataformas de aplicativo de transporte de passageiros, ou de entregas.

Tramitação

A reforma continua em discussão no Legislativo e até a aprovação final da lei, mudanças podem ocorrer. Os congressistas discutem a inclusão de um orçamento para desenvolvimento, operação e manutenção do sistema, redução do prazo de ressarcimento para os créditos em dinheiro, que agora ocorrerá em até 45 dias após a solicitação, às empresas que aderiram a programas de conformidade desenvolvidos pelo comitê do IBS e pela Receita, dentre outros pontos.

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) informou que o setor apoia a criação da tecnologia. Afirmou que contribuirá para induzir a não cumulatividade plena do novo sistema tributário, com potencial de permitir creditar rapidamente às empresas os tributos pagos em todo o processo produtivo de bens e serviços.

“Estamos prontos a dialogar da melhor forma possível sobre os pontos ainda pendentes de regulamentação, como o custeio do desenvolvimento do sistema, a remuneração pela prestação do serviço de arrecadação, limites de responsabilização, prazo de implementação e outras questões técnicas, operacionais e de segurança, que serão naturalmente tratadas para viabilizar o split payment”, afirmou, em nota.

Impactos para as empresas

A adoção do split payment trará mudanças significativas para as empresas. Especialistas apontam que a principal preocupação pode estar no fluxo de caixa das companhias. É que, ainda que o split payment garanta que o tributo seja devidamente recolhido, há preocupações sobre a possibilidade de créditos tributários não serem considerados integralmente no momento da retenção. Isso poderia resultar em um acúmulo de créditos de IBS e CBS, os quais as empresas teriam que solicitar ressarcimento posteriormente.

Além disso, a implementação desse sistema demandará adaptações nos sistemas financeiros e contábeis das empresas, assim como no treinamento dos profissionais envolvidos na gestão tributária. A eficácia do sistema dependerá da precisão das informações fornecidas nos documentos fiscais e da eficiência das plataformas tecnológicas utilizadas para a retenção dos tributos.

Como o split payment funciona:

Divisão dos recebíveis: quando um pagamento é efetuado, o valor correspondente ao imposto é separado do valor da venda e direcionado diretamente ao Fisco.

Segregação dos pagamentos: as operadoras de pagamento (como bancos e empresas de cartão de crédito) são responsáveis por fazer essa segregação, esse split, utilizando códigos específicos nos documentos de pagamento que identificam a natureza dos tributos envolvidos (por exemplo, IBS e CBS).

Comprovação e ajustes: no momento do pagamento, verifica-se se o tributo foi devidamente pago. Caso o tributo já tenha sido pago anteriormente, o valor pode ser utilizado para quitar débitos em aberto ou futuros dentro do mesmo período fiscal. Valores pagos a maior devem ser reembolsados em até três dias, mas a ideia é que seja simultaneamente.

Para pagamentos parcelados, a aplicação do split payment será proporcional às parcelas.

A responsabilidade pelo pagamento do tributo será atribuída ao adquirente, com o Comitê Gestor operando uma conta de saldo zero. Isso significa que o valor arrecadado será repassado integralmente ao contribuinte ou ao Fisco, conforme o caso, assegurando um ajuste eficiente no mercado.


Essa reportagem foi publicada com exclusividade na Revista da Reforma Tributária. Acesse a edição completa aqui (é gratuito).