Impactos da reforma tributária na economia digital

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Markus Spiske via Unsplash

Por Luiz Roberto Peroba

A reforma tributária brasileira, com a introdução do IBS e da CBS, traz impactos significativos para a economia digital, que engloba desde plataformas de streaming e comércio eletrônico até serviços de computação em nuvem e de armazenamento de dados. No sistema atual, esse setor tem enfrentado desafios para adequar-se às regras tributárias existentes, especialmente devido à dificuldade de classificar suas atividades no campo de incidência dos diferentes impostos entre os diferentes entes federativos, o que se torna cada vez mais desafiador frente ao crescimento das transações digitais. A reforma tem o potencial de simplificar e uniformizar a tributação, mas também impõe novas adaptações e obrigações ao setor.

1.​Simplificação e transparência

A implementação do IBS e da CBS, que substituem o ISS, ICMS, PIS e Cofins, promete simplificar o sistema tributário brasileiro ao reduzir a quantidade de tributos e obrigações acessórias. Para a economia digital, que está em constante evolução, o desafio de enquadrar cada atividade nas hipóteses de incidência do ISS ou do ICMS é uma tarefa hercúlea, sem contar as inúmeras guerras fiscais entre fiscos estaduais e municipais que geram um contencioso extremamente volumoso e custoso, tanto para o governo quanto para os contribuintes.

A simplificação da tributação, nesse contexto, elimina esses impasses relacionados à identificação do tributo a ser recolhido e à criação de um contencioso tributário cada vez mais volumoso. Além disso, a simplificação facilita o planejamento tributário e reduz os custos de conformidade, permitindo que empresas de todos os portes consigam cumprir suas obrigações fiscais com menos complexidade e maior segurança. A transparência oferecida pelo novo sistema também é um ponto positivo, pois o setor digital, por sua natureza intangível, demanda uma clareza que possa tornar o cumprimento tributário mais previsível e seguro.

2.​Tributação no destino e competitividade

A adoção do princípio da tributação no destino, em que o imposto é devido no local onde o consumidor final se encontra, é uma mudança central. Para o setor digital, isso significa que o imposto será recolhido na localidade onde o usuário acessa ou utiliza o serviço digital, não mais no local da sede da empresa ou do fornecedor do serviço ou dos bens. Isso pode beneficiar os consumidores, que estarão sujeitos a uma tributação mais justa e alinhada ao seu local de consumo, ao mesmo tempo, em que exige que empresas ajustem suas operações e sistemas para rastrear e reportar o local de consumo com precisão.

3.​Base de incidência ampla e alíquotas uniformes

Com a nova configuração do IBS e CBS, o setor digital, predominantemente de serviços, estará sujeito a uma alíquota uniforme, o que poderá resultar em um aumento da carga tributária para algumas empresas. A economia digital até então se beneficia, em alguns casos, de alíquotas reduzidas, de regimes especiais ou até mesmo de não tributação por falta de previsão expressa na legislação para tributação de determinada atividade, como ocorre no caso do ISS em que os serviços tributáveis devem estar expressamente previstos na Lista de Serviços sujeitos ao imposto.

Com a reforma tributária, não apenas a base de incidência dos novos tributos abrange todas as prestações de serviços, fornecimento de bens e de direitos, mas também as alíquotas são determinadas de maneira uniforme, o que pode elevar os custos de certas operações. Em contrapartida, esse aumento pode ser mitigado pela simplificação do sistema e pelo fim da cumulatividade, o que diminui o custo final ao consumidor e evita distorções no mercado, promovendo maior competitividade e abrindo espaço para que as pequenas empresas se desenvolvam.

4.​Novas obrigações de compliance e desafios operacionais

As mudanças na estrutura tributária introduzem novas obrigações de compliance. Empresas de tecnologia e plataformas digitais precisarão desenvolver sistemas de rastreamento de consumo no destino, adaptar suas práticas contábeis e fiscais para acomodar o novo sistema e manter um controle robusto para evitar riscos de descumprimento. Além disso, o Comitê Gestor do IBS (CG-IBS) e a Receita Federal devem desenvolver ferramentas e regulamentações específicas para auxiliar a economia digital a cumprir com as novas exigências, garantindo que o processo de fiscalização e arrecadação seja eficiente e adaptado à natureza do setor.

5.​ Efeito nos investimentos e inovação

A uniformidade tributária e a simplificação podem criar um ambiente mais atrativo para investimentos no setor digital no Brasil, reduzindo as incertezas jurídicas e facilitando o desenvolvimento de novos negócios com investimento local e estrangeiro. Isso, aliado a uma maior transparência e segurança jurídica, tende a impulsionar a inovação e o crescimento das empresas nacionais, que poderão alocar mais recursos em inovação e desenvolvimento de produtos.

Conclusão

A reforma tributária traz avanços importantes para a economia digital, com a promessa de um sistema mais justo, simplificado e adequado à nova realidade econômica. No entanto, o setor digital enfrentará desafios, especialmente no cumprimento de novas obrigações fiscais e na adaptação ao princípio da tributação no destino.

A forma como esses impactos serão geridos, tanto pelo governo quanto pelas empresas, definirá o sucesso da reforma em promover um ambiente tributário mais competitivo e alinhado às necessidades da economia digital. Para um impacto positivo completo, será essencial que a regulamentação final considere as particularidades do setor, permitindo que a economia digital continue a prosperar e a contribuir com a inovação e o crescimento econômico no Brasil.

Por fim, vale uma atenção especial para proporcionar às empresas regras claras sobre a tributação no destino, responsabilidade tributária e exportação de serviços, buscando evitarmos os mesmos erros do passado com custos de compliance e contencioso desnecessários.


Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no escritório Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.


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