A reforma tributária do consumo, regulamentada pela recém sancionada Lei Complementar (LC) nº 214/25, marca uma transformação sem precedentes no sistema tributário brasileiro, com efeitos diretos sobre o ambiente de negócios e, em especial, sobre operações de fusões e aquisições. Essa nova realidade exige uma avaliação criteriosa de aspectos fiscais e financeiros, impactando tanto a precificação quanto a estruturação das transações. Para empresas e investidores, compreender as mudanças trazidas pela reforma é fundamental para minimizar riscos, adaptar estratégias e identificar oportunidades no novo cenário tributário.
Dentre os pontos principais para o exercício de avaliação das empresas-alvo e valor das transações que podem ser afetados pela reforma tributária, com base nas regras trazidas pela LC 214/25, é importante destacar os seguintes:
(i)nova sistemática de formação de preços: com a implementação do IBS e da CBS, que não serão incluídos no preço da venda de mercadorias ou prestação de serviços (como ocorre com os tributos atuais), haverá uma mudança significativa na estrutura de formação de preços. Para que as projeções de receitas de vendas reflitam adequadamente essa transição, é essencial ajustar os modelos de precificação ao novo regime tributário. Essa adaptação é crucial para que valuations utilizem premissas corretas e alinhadas com a realidade fiscal, garantindo maior precisão nos cálculos e decisões estratégicas;
(ii)impactos no fluxo de caixa: a nova regra de creditamento do IBS e da CBS permite ao contribuinte apropriar créditos sobre todas as aquisições de bens e serviços tributados e utilizados nas operações da empresa, diferentemente do modelo atual, em que IPI, PIS, Cofins e ICMS geram créditos tributários apenas para alguns insumos, especialmente os ligados ao processo produtivo e incorporados ao produto final, e o ISS não gera créditos. Essa mudança pode impactar o fluxo de caixa das empresas e o resultado financeiro, tanto diretamente, pelo escopo e pelo momento do aproveitamento dos créditos, quanto indiretamente, pelo potencial aumento de vendas a clientes que também podem ser beneficiados pela nova sistemática;
(iii)regimes especiais de tributação e benefícios fiscais: é fundamental considerar as mudanças na carga tributária incidente sobre as operações das empresas-alvo, especialmente daquelas que possuem atualmente algum tipo de regime especial de tributação ou benefício fiscal, os quais têm o potencial de alterar seu valor de mercado, uma vez que a reforma prevê a extinção desses regimes especiais e benefícios fiscais. Essas alterações reforçam a importância de uma análise tributária detalhada para avaliar os efeitos no fluxo de caixa projetado e o impacto potencial no valuation ao longo dos próximos anos;
(iv)utilização de créditos acumulados dos tributos que serão extintos: para o PIS e a COFINS, os créditos não apropriados ou não utilizados até a data de extinção dessas contribuições poderão ser utilizados para compensação com o valor devido da CBS ou ressarcidos em dinheiro ou compensados com outros tributos federais, enquanto o saldo credor do ICMS existente na extinção desse tributo poderá ser aproveitado pelos contribuintes mediante homologação pelos Estados e Distrito Federal, observados requisitos específicos para esses procedimentos;
(v)redução de litígios relacionados à tributação indireta: atualmente, a complexidade do sistema tributário gera um contencioso volumoso para as empresas, que impactam diretamente as negociações em operações de compra e venda de empresas. Com a simplificação do sistema tributário, o volume do contencioso tende a reduzir ao longo do tempo, impactando positivamente a avaliação das empresas-alvo. Mais do que isso, contingências relevantes de tributos que serão extintos como, por exemplo, PIS e COFINS, devem passar a ter uma importância menor nas negociações e valuation.
Em conclusão, a reforma tributária traz mudanças profundas que impactam diretamente o mercado de fusões e aquisições. Alterações no sistema de precificação, no fluxo de caixa e na estrutura societária das empresas demandam ajustes estratégicos para garantir conformidade e maximizar oportunidades no novo cenário tributário. Além de simplificar a legislação, a reforma oferece maior eficiência e transparência, essenciais para fortalecer a competitividade e a sustentabilidade das transações no mercado de fusões e aquisições.
Luiz Roberto Peroba É Sócio/Tax Partner no Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.
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