Esquecida pelos candidatos, reforma tributária pode reduzir receita de municípios, alertam especialistas

A tendência é que uma minoria, os mais ricos e populosos, se beneficie
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A tendência é que uma minoria, os mais ricos e populosos, se beneficie

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Urna eletrônica – Fotomontagem com imagens de Flickr e Texturelabs por Adrielly Kilryann/Jornal da USP

Por Redação

As eleições municipais deste ano têm sido marcadas por fortes ataques pessoais, culminando até mesmo em cenas de agressão entre candidatos. No entanto, enquanto as atenções estão voltadas para a troca de ofensas, um tema crucial está sendo pouco discutido: a reforma tributária, especialmente a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituirá o ISS, uma das principais fontes de receita dos municípios brasileiros.

O advogado Carlos Crosara, do escritório Natal & Manssur, especialista em Direito Tributário pela PUC/SP e mestre em Direito Tributário pela USP, alerta para os impactos que a mudança trará às cidades. Segundo ele, a adoção do critério de destino na repartição do IBS pode causar uma queda significativa na receita de diversos municípios, especialmente os menores e com menor poder aquisitivo. “Pelo critério do destino, a arrecadação será direcionada aos entes federativos com maior consumo de bens e serviços. Dessa forma, alguns municípios verão suas receitas aumentarem, enquanto outros, principalmente os menores, enfrentarão uma redução nas receitas tributárias”, afirma Crosara.

Marcelo Costa Censoni Filho, sócio do Censoni Advogados Associados e CEO do Censoni Tecnologia Fiscal e Tributária, complementa a análise, destacando que a substituição do ISS pelo IBS pode prejudicar os municípios produtores que abrigam grandes indústrias ou refinarias, mas possuem uma população pequena. “O IBS será recolhido no local de consumo, e não no local de produção, o que significa que municípios que dependem fortemente do ISS podem ter uma redução significativa em sua arrecadação. Isso tende a aumentar a desigualdade fiscal entre os municípios de diferentes portes”, explica Censoni Filho.

Ranieri Genari, advogado especialista em Direito Tributário pelo IBET e consultor tributário na Evoinc, acrescenta que a proposta atual do IBS, que deverá integrar um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) com alíquota global estimada em 26,5%, pode obrigar muitos municípios a praticarem alíquotas menores do que as atuais para se adaptarem à nova estrutura tributária. “Cidades que hoje têm uma alíquota de 5% de ISS podem ser forçadas a adotar uma alíquota menor, o que trará desafios para a manutenção de suas receitas”, explica Genari.

Com mais de 5.570 municípios no Brasil e apenas uma pequena parcela com mais de um milhão de habitantes, a reforma tributária precisa ser analisada com cautela. “A tendência é que uma minoria de municípios mais ricos e populosos se beneficie, enquanto a grande maioria, composta por municípios pequenos, enfrente perdas significativas de arrecadação. É essencial que os gestores municipais acompanhem de perto a proposta para evitar um possível endividamento e buscar alternativas para compensar as perdas”, reforça Crosara.

As considerações dos especialistas levam em conta o cenário atual e uma realidade futura projetada com base nas premissas de hoje. “Vale lembrar que a reforma valerá plenamente, com o uso total do critério de destino, somente após o prazo de transição de 50 anos. É impossível prever como o Brasil estará depois de todo esse tempo. Nesse meio-tempo, quando o IBS e a CBS entrarem em vigor, os repasses devem considerar as médias percentuais de arrecadação de estados e municípios em relação ao total arrecadado”, finaliza Crosara.